As Rodas de Leitura
Autora: Márcia Patrícia Barboza de Souza
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A memória me remete ao tempo de infância, quando lia meus livrinhos (os quais guardo até hoje em uma estante) várias vezes até decorar toda a historinha. Fazia isso por prazer, porque gostava de olhar as figuras e já saber o que estava escrito. Mais adiante me lembro da adolescência, na verdade nem me lembro dos livros que li nessa fase, sei que os lia na escola, junto com outros colegas, em voz alta para todos acompanharem. Depois preenchíamos uma folha com algumas perguntas sobre o livro e só. ‘Só’ no sentido ambíguo da palavra. A leitura pode ser esse equívoco: atividades sem reflexão, somente obrigação em cumprir tarefas ou muitas vezes alguém sozinho, mergulhado nos escritos, concentrado no silêncio do ato de ler. Porém, ela não deve ser vista somente como característica solitária, ao contrário, a companhia de alguém pode ser bem estimulante, pode gerar conflitos de opiniões em uma discussão harmoniosa, sendo uma mesma história percebida através de ângulos diferentes.
Dessa forma os grupos de leitura apresentam características positivas e oportunizam momentos de encontros e reflexão, e fazem com que possamos conhecer melhor o outro, assim como aponta Larrosa (2004) essa é uma das transformações que a leitura pode proporcionar. É interessante destacar que nesse trabalho coletivo e interativo com a leitura podem ser discutidos textos literários, filosóficos, científicos, teológicos, dependendo dos interesses dos grupos. As rodas de leitura trabalham com o ato de ler em sua essência: ler com prazer, ler para entender o escrito, ler para introduzir-se no mundo imaginário e trazê-lo à realidade, numa espécie de descoberta com a verdade. Assim, não se pode negar que a leitura em grupo amplia e ordena nossos conhecimentos.
A literatura nos mostra que as rodas de leitura contribuem de forma significativa na formação de novos leitores, melhoram a participação, o espírito crítico, a atenção e a criatividade do sujeito. O objetivo das rodas de leitura é compreender a essência do escrito num processo dialógico da linguagem, assim como aponta Bakhtin (1992). A leitura implica construção de sentidos, pois não se resume apenas em decodificar a mensagem, mas também absorver os múltiplos sentidos que ela proporciona.
Por isso é imprescindível que o leitor compartilhe dos sentidos do autor e seja capaz de construir os seus próprios. Sentidos estes construídos no momento de interação que acontece entre texto e leitor, daí a importância que este tem em reunir seus conhecimentos sobre os gêneros discursivos para ser capaz de formular sentido nessa interação com o autor.
Nas rodas de leitura é importante considerar a colaboração sem que haja a competição, pois uma vez que o objetivo do grupo seja constituir uma troca, a presença de alguém que queira se tornar o ‘dono da palavra’ pode inibir os demais participantes e assim não permitir a interação. Para que isso não aconteça, o leitor-guia deve ser experiente e promover a igualdade de participação.
As rodas de leitura se caracterizam por seu perfil de ‘compartilhamento’, no qual os participantes se reúnem em torno de um leitor-guia. Além disso, devem oferecer um ambiente favorável ao grupo, com um número médio de freqüentadores, apresentando assuntos diversificados ou estudos aprofundados de um mesmo tema; também devem ser considerados o tempo e a intertextualidade, todos critérios que auxiliam na ampliação dos horizontes de leitura pelos não-iniciados.
Reafirmando o pensamento de Yunes (1999, p.21), “ler em círculo não é novo: novo é o uso do círculo para aproximar os leitores na troca de suas interpretações”.
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